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26 ABR 2017

Cetic.br discute produção de indicadores sobre práticas culturais on-line




Pesquisadores da área trocaram experiências em encontro no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo

Como medir os novos hábitos culturais que surgem a partir das tecnologias digitais? Para analisar a questão e trocar experiências, pesquisadores da área cultural reuniram-se na quarta-feira (19/04) no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc (CPF-Sesc), em São Paulo. Sob o tema Práticas Culturais e as novas tecnologias: desafios para produção de indicadores, o encontro foi realizado com apoio do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br). Foram discutidos os marcos de referência atuais e medições de práticas culturais na América Latina e Brasil, e os desafios à diversidade on-line com o fortalecimento de grandes corporações do campo digital. Além disso, o evento trouxe importantes insumos para o projeto de pesquisa TIC Cultura do CGI.br.

"Nos últimos 10 anos, a tecnologia mudou radicalmente a forma que acessamos e consumimos cultura, além da própria produção de conteúdos culturais. Essas mudanças de paradigmas tornam a investigação desse campo mais complexa", lembrou Alexandre Barbosa (gerente do Cetic.br). Ele destacou os compromissos dos países membros da ONU com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, especificamente o Objetivo 11.4 (“Reforçar os esforços para proteger e salvaguardar o patrimônio cultural e natural do mundo”), enfatizando que "a cultura está exercendo um papel crucial, não só por questões simbólicas, mas por sua dimensão econômica. Falar sobre essa Agenda e criar indicadores para mensurá-la é uma necessidade para os governos signatários".

O assunto foi aprofundado no painel "Marcos de referência para indicadores de práticas culturais: desafios para a agenda 2030", do qual Alexandre foi moderador. Em sua apresentação, José Pessoa (Unesco Institute for Statistics) introduziu os conceitos e as definições do Quadro de Estatísticas Culturais da Unesco 2009, utilizado para definir o setor cultural e permitir a harmonização de variáveis culturais entre inquéritos nacionais.

Leonardo Athias (IBGE) comentou os desafios para produção de indicadores considerando as dimensões das práticas culturais on-line. No que diz respeito ao mercado de trabalho, por exemplo, um dos desafios está na fronteira entre o amador e o profissional, traduzido no surgimento de profissões como youtubers. Frederico Barbosa (Ipea) também refletiu sobre as dificuldades para mensurar dados. "Como elaborar perguntas relacionadas aos aspectos da vida e prática cultural? As práticas deslizam, são plurais, múltiplas. Perguntas tradicionais são insuficientes para o entendimento das práticas em tua totalidade", considerou.

Medições internacionais

As experiências de medição de práticas culturais em outros países da América Latina, aliada ao que tem sido feito no Ministério da Cultura, foram abordadas durante o evento. Juan Carlos Altamirano (Consejo Nacional de la Cultura y las Artes do Chile) apresentou os dados de pesquisas sobre o uso da Internet no Chile, destacando as atividades culturais realizadas pelos chilenos conectados. Federico M. Bonazzi (Sistema de Información Cultural de la Argentina) compartilhou as conclusões da pesquisa sobre o uso de TIC na Argentina, entre elas: a ampliação do consumo de bens culturais por meio da Internet com queda do download de conteúdo e aumento do streaming no país. No caso do Brasil, Luiz Antonio Gouveia de Oliveira (MinC) foi responsável por comentar as funcionalidades do Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais (SNIIC), no debate moderado pela consultora Cristina Lins.

Medições no Brasil

O painel dedicado às experiências brasileiras analisou os potenciais e limites da Internet para a democratização cultural. "Estamos diante de uma ferramenta que permitirá o tão desejado acesso e fruição da população ao repertório de arte e cultura?", questionou Isaura Botelho (Cebrap). Para a especialista, os pesquisadores devem verificar em que medida as opções e conteúdos disponíveis on-line se traduzem em práticas concretas. "Não podemos nos render aos fascínios da tecnologia de maneira a não perder de vista os objetivos das políticas, sejam de organismos públicos ou privados, para contribuir com o universo das práticas culturais", reforçou.

Dos números binários ao computador quântico, a apresentação de Marcos Cuzziol (Itaú Cultural) traçou um panorama da evolução da tecnologia. Sob a mediação de Daniela Ribas (CPF Sesc), o painel também contou com a participação de Ricardo Meirelles (JLeiva), que apresentou dados da pesquisa sobre hábitos culturais dos paulistas. Ainda na ocasião, Márcia Costa Rodrigues (Departamento Nacional do Sesc) listou as atividades culturais do Sesc, reforçando que "a tecnologia é fundamental para propiciar acesso aos conteúdos produzidos pela entidade aos mais diferentes públicos".

Ameaças à diversidade

Sob o tema "Os novos Gatekeepers: plataformas tecnológicas, consumo cultural e diversidade", João Brant (pesquisador associado do Observacom) listou as ameaças à diversidade cultural e ao pluralismo on-line – entre elas, a remoção de conteúdo sem ordens judiciais e as distorções geradas pelo ordenamento das informações. "Há um volume crescente de informações on-line, mas o acesso está cada vez mais mediado por intermediários. É um paradoxo. Temos mais informações disponíveis e menos informações consumidas", refletiu.

O decálogo de princípios para a governança e uso da Internet do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) foi apresentado, especificamente no que diz respeito à diversidade (A diversidade cultural deve ser respeitada e preservada e sua expressão deve ser estimulada, sem a imposição de crenças, costumes ou valores) por Juliano Cappi (Assessoria Técnica CGI.br) e Carlos Affonso Pereira de Souza (ITS - Instituto de Tecnologia e Sociedade). Ambos enfatizaram que o texto envolve questões cruciais como dignidade, autonomia e democracia, e não só trata do respeito à diversidade, mas da sua preservação e estímulo para que prospere.

Outro tópico discutido no encontro, o efeito "filtro-bolha" (que é a customização de conteúdo exibido em redes sociais de acordo com as preferências dos usuários) foi apontado por Brant e Carlos Affonso como um dos riscos à diversidade na rede. "A visão de que o mundo concorda com suas percepções é um trampolim de radicalização que leva a dois resultados: notícias falsas e discursos de ódio", enfatizou Carlos Affonso. Na opinião do pesquisador, o incentivo à educação e senso crítico on-line é uma das soluções, assim como o desenvolvimento de inteligência artificial que identifique conteúdos dessa natureza.