Tecnologia pode se tornar aliada na aprendizagem escolar
A Gazeta - 7/8/2025 - [gif]
Assunto: Uso de tecnologias na educação
Com uso consciente, a tecnologia se torna parte da rotina escolar por proporcionar meios dinâmicos para explicação dos conteúdos e pode ajudar até no bem-estar emocional dos estudantes
“Há 20 anos eu tinha de fazer, por exemplo, um trabalho sobre o Teatro Carlos Gomes. Meu recurso era procurar em jornais e fascículos como A Gazetinha, que saía todo sábado, e passar horas procurando algo relativo ao tema. Hoje, qualquer pessoa que digitar ‘Teatro Carlos Gomes’ no Google vai saber a história inteira, as curiosidades, as imagens, os vídeos, absolutamente tudo. Como isso pode ser ruim?”
O relato acima é de Otávio Lube, pesquisador e professor da Superintendência de Educação a Distância (Sead) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). A pergunta lançada pelo professor traz à tona a questão de que, em tempos de intensos debates sobre os efeitos da tecnologia na infância e na juventude, é preciso lembrar que ela pode ser uma aliada valiosa – tanto nos estudos quanto no cuidado com a saúde mental. Com um detalhe: desde que seja usada de forma adequada.
Aplicativos de organização de tarefas, inteligência artificial (IA) generativa, plataformas de revisão de conteúdo e apps de respiração e meditação são hoje parte da rotina de muitos alunos que enfrentam jornadas intensas de estudos e pressão por resultados.
Nesse cenário, as ferramentas que dão aos estudantes condições para que planejem suas atividades, acompanhem seu progresso, revisem conteúdos de forma interativa e obtenham feedback imediato sobre seu desempenho contribuem diretamente para uma aprendizagem mais eficiente e autônoma.
Para Marcilyanne Moreira Gois, professora e coordenadora do curso de Ciência da Computação da Universidade Presbiteriana Mackenzie, essas soluções são uma forma de ajudar jovens e crianças a priorizar o que é mais importante, desde que estejam atreladas a um uso consciente.
“Temos o Google Agenda, que ajuda a organizar e a não esquecer os compromissos de estudos. O Todoist e Trello auxiliam os estudantes a visualizar responsabilidades, definir prioridades e criar rotinas. Além disso, podemos contar com o auxílio das IAs, que conseguem apoiar com essa organização. O importante é ter disciplina e um planejamento pessoal, a tecnologia apenas facilita a execução do que você decide fazer”, pontua.
Lube complementa ao dizer que o avanço tecnológico é essencial e não deve ser tratado como vilão. “A tecnologia é, simplesmente, um meio pelo qual a gente chega às respostas dos problemas. O problema não é a tecnologia, mas sim a metodologia utilizada para que ela sirva como base para criação, aprendizado e resolução de problemas. A grande dica que eu dou é: conheça as ferramentas. Tem muita gente falando sobre inteligência artificial, mas não faz a mínima ideia de como funciona”, defende.
Tecnologia pode ser ferramenta na rotina escolar
No ambiente escolar, o uso de ferramentas digitais e de inteligência artificial (IA) tem ganhado cada vez mais espaço. Para Helber Firme, diretor da Escola Edward Dodd, em Vila Velha, a IA deve ser usada como ferramenta de apoio, e não como substituta do pensamento crítico.
“Em nossa escola, orientamos para que o uso seja acompanhado de um olhar crítico e reflexivo. É importante que o estudante entenda que a IA não deve ser utilizada como fonte principal ou como substituta do raciocínio lógico, mas sim como uma ferramenta de apoio”, pontua.
Atualmente, a rotina da escola conta com plataformas de ensino adaptativas que criam relatórios individuais de acordo com a vida acadêmica de cada estudante. “Usamos a tecnologia como ferramenta de estudo, para geração de provas, atividades e conteúdos e, por fim, para monitoramento e condicionamento dos resultados”, conclui o diretor.
Com o mesmo objetivo de usar o mundo digital para potencializar os estudos, a Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo (Sedu) informou, em nota, que a tecnologia tem sido incorporada de forma estratégica ao currículo e à gestão educacional do Espírito Santo, com iniciativas que promovem tanto a aprendizagem quanto o bem-estar dos estudantes da rede pública estadual.
Um desses programas é uma ferramenta de correção textual baseada em IA que é usada em todas as escolas de ensino médio. Implementado em 2022, o sistema corrige automaticamente produções dissertativo-argumentativas e oferece aos alunos devolutivas personalizadas e instantâneas que orientam na reescrita dos textos.
Os professores acompanham o desenvolvimento dos estudantes, analisam os retornos da plataforma e fazem intervenções pedagógicas complementares. A ferramenta ainda disponibiliza recursos de apoio, como vídeos explicativos, infográficos, dados atualizados e textos de referência.
“Os resultados já são visíveis. Em 2025, 79% das turmas da terceira série do ensino médio utilizam ativamente o sistema. Em 2024, o Espírito Santo obteve a maior média de redação no Enem entre as redes estaduais do país, com 636 pontos. Cerca de mil alunos capixabas alcançaram notas superiores a 900 na prova”, afirma a Sedu.
Além disso, o Estado lançou três aplicativos gratuitos para diferentes perfis da comunidade escolar: o Seges Responsáveis, que permite às famílias acompanharem a frequência, as notas e o boletim escolar dos alunos; o Seges Professor, com o objetivo de registrar faltas e notas; e o Seges Gestor, que disponibiliza relatórios com dados sobre estudantes, docentes e turmas.
Uso com segurança requer habilidades
Apesar dos benefícios e praticidades advindos da tecnologia, os cuidados ainda são necessários. Na avaliação de Isabela Ferro, analista de projetos de educação na Safernet Brasil, não basta apenas disponibilizar as ferramentas como também é preciso garantir que os estudantes tenham competências digitais para usá-las.
A análise parte de um dado presente na última pesquisa TIC Kids Online Brasil, realizada em 2024. Nela, ficou constatado que 86% de crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos afirmam pesquisar na internet para fazer trabalhos escolares, mas 50% deles concordam com a afirmação de que o primeiro resultado de uma pesquisa na internet é sempre a melhor fonte de informação, o que nem sempre é verdade.
“Aquele primeiro resultado pode ser um anúncio pago, pode ser de um site não confiável. Então, novamente, a gente precisa aprofundar um pouco essa discussão em termos de habilidades e competências digitais”, reforça a analista.
Essa falta de senso crítico também se aplica a informações sobre saúde mental. Nesse sentido, Isabela questiona: “Utilizar ferramentas tecnológicas como buscadores ou IAs para pesquisas de saúde mental requer cuidado. Será que essa fonte é confiável? Será que eu não estou expondo demais a minha vida ali para uma IA, por exemplo?”
Para evitar tais transtornos, responsáveis e professores devem estar atentos ao uso e guiar as crianças e os adolescentes para um uso seguro. “A tecnologia auxilia, mas depende também da nossa atuação e do comprometimento para seguir o nosso planejamento, que é a chave para qualquer tarefa educacional. Mas sem objetivos claros e acompanhamento humano, a tecnologia vira distração. O professor e os responsáveis continuam sendo fundamentais para orientar o uso”, conclui Marcylliane, professora do Mackenzie.
Dicas de aplicativos para usar com confiança
A seguir, confira cinco aplicativos e ferramentas recomendados pelos especialistas entrevistados:
- Khan Academy: plataforma gratuita com videoaulas, exercícios e conteúdos interativos de diversas disciplinas escolares, com conteúdos que vão dos anos iniciais ao ensino médio. Ideal para reforço escolar e estudo autônomo.
- Duolingo: aplicativo gratuito para aprender idiomas de forma gamificada. Oferece lições curtas e práticas diárias para desenvolver vocabulário, gramática e compreensão em línguas como inglês, espanhol e francês.
- Coursera: plataforma que oferece cursos on-line gratuitos e pagos de universidades nacionais e internacionais. Abrange áreas como Tecnologia, Negócios, Saúde, Ciências Sociais e Humanas.
- Headspace: aplicativo voltado à meditação, à atenção plena e ao sono. Tem versões gratuitas com sessões guiadas para relaxamento, foco, alívio da ansiedade e melhor qualidade de sono.
- Calm: oferece meditações guiadas, trilhas sonoras relaxantes, histórias para dormir e exercícios de respiração. Focado no equilíbrio emocional e na redução do estresse.