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08 ABR 2025

Questão tributária busca atacar pilares da governança da Internet


Blog do Demi: Cadeira de Barbeiro - 8/4/2025 - [gif]


Autor: Demi Getschko
Assunto: Governança da Internet

O argumento ortogonal de que ‘tarifação igual elimina a necessidade de distinção’ é um sofisma diversionista

Em 31 de maio o Comitê Gestor da Internet no Brasil completa 30 anos. O duplo político-técnico, que envolve a operação do .br desde 1989 mais o CGI desde 1995, sempre foi reconhecida mundialmente por sua postura coerente na defesa da internet e seus princípios originais, a par de um funcionamento técnico de escol.

Em 1995, num mesmo dia, houve a criação do CGI por portaria conjunta do ministro da Ciência e Tecnologia, José Israel Vargas, e do ministro das Comunicações, Sérgio Motta, e outra portaria, do ministro Sérgio Motta, estabelecendo o que se conhece como Norma 4. Esse conjunto virtuoso de portarias espelhava o resultado de intenso debate, liderado pela comunidade acadêmica e pela sociedade civil, que, à época, eram os componentes principal da internet no Brasil. Redes como a do Ibase, ANSP, RNP e os reflexos positivos da Eco-92.

A Norma 4 define “internet” e conceitos de seu ambiente, como “serviço de conexão”. Já deixava claro então que esses serviços são distintos da “rede de telecomunicação que os suporta”. Ou seja, internet não é “telecomunicação”. Isso ficou ainda mais sólido quando da promulgação da LGT – Lei Geral de Telecomunicações, em julho de 1997, especialmente em seus artigos 60 e 61. O 61, em particular reza: “Serviço de Valor Adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas…”. Note-se o setor de telecomunicações era então estatal, e que a própria Anatel seria criada em novembro do mesmo 1997.

O ambiente úbere criado em 1995, época em que praticamente tudo na internet era gratuito, permitiu seu rápido crescimento no Brasil. Inicialmente com a migração das BBS (“Bullet Board Systems”) existentes e, logo em seguida, com a entrada em cena de empresas de mídia, que criaram seus próprios provedores de acesso e de informação, já em português. O brasileiro não é avesso a novidades, e a aceitação da internet como nova e ampla forma de comunicação foi célere.

O modelo brasileiro, multissetorial e aberto, tornou-se autossustentável a partir de 1998 e foi saudado como espelho fiel dos princípios originais da internet: abertura, liberdade, inclusão. Vint Cerf, ‘pai da internet’, ressaltou: ‘O CGI.br é uma referência global. A internet deve ser construída com a participação de todos, não apenas de governos ou corporações”. Na mesma linha foi Tim Berners-Lee, e outros de relevo na rede. A dupla virtuosa CGI/NIC, modelo invejado, retorna para a própria rede os recursos privados que recebe, e em 2022 pôde gabar-se de operar em São Paulo, o ponto de interconexão com mais tráfego do mundo, além de outros resultados auspiciosos.

Trinta anos depois, esse legado é desafiado por propostas que procuram confundir deliberadamente telecomunicações e serviços de valor adicionado (SVA). O argumento ortogonal de que ‘tarifação igual elimina a necessidade de distinção’ é um sofisma diversionista, um “arenque defumado” (“red herring”) que, partindo de uma questão tributária, busca atacar, de forma enviesada, pilares da governança da internet.