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08 MAR 2021

Pagar internet em Corumbá e Ladário é comprar ‘gato por lebre’


Correio de Corumbá - 7/3/2021 - [gif]


Autor: Rodolfo César
Assunto: Infraestrutura da Internet

Internet chega no Brasil por cabos submarinos no oceano, mas sem investimento sinal não consegue passar pelo Pantanal

O que você faria se toda vez que fosse comprar pão, uma fruta, carne ou qualquer outro produto que é vendido no kilo a balança "roubasse" no peso? O peso real do produto seria 1 kg, mas na hora de pesar no caixa a balança mostraria 1,5 kg ou 2 kg. Com isso, você iria pagar até o dobro do que na verdade deveria. Essa situação ainda seria mais gritante porque você ia saber que o quilo medido estava errado, na balança tinha um recado informando que ela apresenta falha.

Essa cena é difícil de imaginar na realidade. Pior ainda é imaginar que isso iria acontecer por anos e todos que fizessem compra ali, iam pagar o valor errado.

Mas não é impossível de trazer essa situação para Corumbá e Ladário. Não é em supermercado que existe esse problema. Ele ocorre com quem paga pelo serviço de internet aqui por essa região. São mais de 11,5 mil pessoas e empresas que pagam integralmente pelo acesso e dificilmente recebem o produto que adquiriram ao longo do mês.

Só entre fevereiro e março de 2021, as oscilações vem ocorrendo nos últimos três finais de semana. Mais recentemente, nesta sexta-feira (5), no período da manhã, houve interrupção do sinal de internet, que só foi funcionar por volta das 17h. No quinto dia útil do mês, tradicional para pagamento de contas, pagamento de salários, bancos chegaram a fechar mais cedo porque não havia sistema. Comércios deixaram de receber quem decidisse pagar com cartão e qualquer serviço que dependesse de conexão com a rede mundial de computadores precisou esperar. Aula online? Impossível!

Todo mundo que pagou seu acesso à internet para um mês teve o prejuízo de não receber o produto pelo período de, ao menos, seis horas nesta sexta-feira (5). E é possível aguardar que essa falha pode repertir-se novamente ainda dentro deste mês.

Clara Lito tem um restaurante no Centro de Corumbá e um hotel. Já se cansou de perder pedido ou receber avaliações ruins porque sua máquina de cartão não passava com a falta de internet ou o hóspede queria usar wifi e o sinal não funcionava. "Nenhuma entrega que fiz (nesta sexta-feira, 5 de março) teve como pagar, praticamente todo mundo me paga no cartão. Você paga a internet para o mês inteiro, mas você não recebe. Minha conta dá mais de R$ 1 mil por conta do restaurante e do hotel. Tem hóspede que reclama, coloca avaliação negativa porque fala que a gente diz que oferece wifi, mas faz propaganda enganosa. E tudo como se a culpa fosse minha. Tenho prejuízo, sim. Mas nem tem mais como contabilizar porque isso vem de muito tempo. Aqui em Corumbá a gente, infelizmente, parece que se acostumou com isso", lamenta.

A região de pior conexão com a internet no Brasil é a Norte, onde estão os Estados de Amazonas, Acre, Roraima. Corumbá está localizada no Centro-Oeste, onde há qualidade boa, mas a internet na cidade é considerada com dados semelhantes a todos os Estados da região Norte. Essa classificação foi feita pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Tecnologia de Redes e Operações (Ceptro). Esse órgão é responsável por iniciativas e projetos que apoiam ou aperfeiçoam a infraestrutura da internet no Brasil.

A internet chega no Brasil por meio de cabos submarinos, uma infraestrutura gigantesca e que exige manutenção constante e alto custo. Esses cabos que conectam o país ao mundo chegam por Fortaleza (CE), Salvador (BA), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). A regra para conectar Corumbá ao mundo pela internet exige uso dessa estrutura e precisa passar por algumas dessas quatro cidades. As distâncias são enormes: para Fortaleza são mais de 3,3 mil quilômetros; para Salvador são quase 3 mil quilômetros; para o Rio de Janeiro, 1,8 mil quilômetros; e para São Paulo, 1,4 mil quilômetros.

"Muitos fatores contribuem para isso (problema de conexão com a internet). Os principais são ligados à dificuldade em prestar o serviço e os custos relacionados. Outra questão importante são os Pontos de Troca de Tráfego Internet no Brasil (chamados de ix.br). O ix.br, operado pelo NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação no Ponto BR), está presente em 33 localidades. O mais perto de Corumbá é o de Campo Grande, mas lá as empresas de conteúdo (Globo.com, Google, Facebook, Netflix, Amazon, etc) não estão presentes e o mais próximo é São Paulo", explica o departamento técnico do IX.br/NIC.br, em comunicado oficial enviado ao Correio de Corumbá.

O IX.br é o projeto do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGIbr) que promove e cria a infraestrutura necessária para a interconexão direta entre as redes que formam a internet brasileira. O NICbr (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR) implementa as decisões e os projetos do Comitê Gestor da Internet no Brasil.

Mas, afinal, é possível melhorar o acesso à internet em Corumbá? A cidade é afastada dos centros onde os cabos chegam, mas é bom lembrar que esses mesmos cabos percorrem milhares de quilômetros no oceano adentro para chegarem ao Brasil.

Conforme esses órgãos que ajudam no gerenciamento da internet no Brasil, a solução para Corumbá existe e depende de investimento e interesse. Por enquanto, é possível afirmar que nenhuma das duas questões é atendida. "(A solução) Vai depender de empresas Provedoras de Acesso Internet estarem interessadas em atender a localidade e como o serviço será prestado, se usando fibra óptica, satélite, via rádio, serviço de telefonia celular, rede sem fio, etc. As tecnologias têm os seus custos envolvidos e pode ser inviável financeiramente atender a cidade de Corumbá ou o serviço ficar a desejar", aponta o IX.br, em nota.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) é o órgão público que regulamenta o serviço, mas apesar dos procedimentos abertos contra a Oi, empresa que domina o mercado em Corumbá e Ladário para acesso à internet, a agência não conseguiu exigir investimento suficiente para melhorar a conexão.

Uma briga que exige do consumidor
Para o IX.br, o consumidor lesado por não receber o pacote comprado para acessar a internet tem a possibilidade e medir o serviço prestado por meio da ferramenta de medição SIMET (que pode ser acessada em https://simet.nic.br/). A partir dos relatórios periódicos da ferramenta, uma cópia pode ser enviada para o provedor de internet para reclamar do serviço. O mesmo pode acontecer encaminhando essa mesma documentação para a Anatel a partir do site https://www.gov.br/anatel/pt-br/consumidor/quer-reclamar/reclamacao.

"Ter Internet não depende só de ter fibra óptica ligando uma localidade a outra. Depende de estar conectado a localidades onde os principais conteúdos estão presentes. No caso de Corumbá, uma solução possível é o Provedor de Acesso Internet ligar Corumbá a Campo Grande com fibra óptica e se conectar aos Pontos de Troca de Tráfego Internet de Campo Grande (https://ix.br/trafego/agregado/cgr). A partir disso, será possível, encontrará empresas que prestam serviço de transporte de Campo Grande a São Paulo, no Ponto de Troca de Tráfego Internet de São Paulo (https://ix.br/trafego/pix/sp), o maior Ponto de Troca de Tráfego do mundo. E (a cidade) estando conectada (a esse Ponto de Troca), mais de 70% do tráfego necessário para atender a um usuário médio será encontrado nesta mesma infraestrutura", detalha o corpo técnico do IX.br.

Uma ação coletiva e organizada na cidade pode dar um pontapé inicial para exigir que provedores de acesso façam essa contratação ao Ponto de Troca de Tráfego de Internet e tente mobilizar grandes empresas, como Google, para haver tráfego necessário para atender as pessoas. Ainda não existe em Corumbá e Ladário um movimento organizado e coletivo capaz de reunir as mais de 11,5 mil pessoas e empresas que pagam pela internet para movimentar em prol de melhorias. O local para solicitar as especificações técnicas para começar essa luta está em https://nic.br/quem-somos/.