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10 JUL 2018

Órgãos de controle da publicidade infantil não dão conta do recado


O Tempo - 08/07/2018 - [gif]


Autor: Litza Mattos
Assunto: Indicadores

Internet no celular dificulta acompanhamento do conteúdo até pelos responsáveis

Apesar de o Brasil já ter previsto em diversas leis – no Código de Defesa do Consumidor, na resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – a identificação e punição de publicidade infantil, o maior volume de mídias disponíveis dificulta a aplicação de penas às empresas que desobedecem às regras. Talvez por isso, tramitam no Congresso pelo menos 11 projetos sobre propaganda direcionada à criança.

Recentemente, o Committee on Advertising Practice, órgão que regula a publicidade na Inglaterra, anunciou a proibição de propagandas de junk food em cinemas, internet e revistas para menores de 16 anos, incluindo games e redes sociais. As regras são uma tentativa de ajudar a combater a obesidade num contexto em que as crianças ficam online por longos períodos.

No mesmo relatório em que a OMS advertiu que os pais muitas vezes não estão cientes do grande volume de tais anúncios, o órgão também criticou os governos por não conseguirem acompanhar a revolução na maneira como as pessoas consomem mídia.
 
Advogada do programa Criança e Consumo, do Instituto Alana, Livia Cattaruzzi entende que a publicidade direcionada já é proibida pela legislação existente no Brasil, mas não descarta um reforço. “As leis hoje são suficientes, mas não prejudicaria ter outras que complementassem”, reconhece.

O coordenador de projetos e pesquisas do Cetic.br, Fabio Senne, pontua alguns desafios a partir do cenário de que a maioria das crianças está consumindo internet a partir de telefone celular. “Enquanto a TV era uma mídia mais compartilhada pela família e mediada pelos pais, o uso de smartphone é individual e dificulta o acompanhamento dos pais”, diz.

Do ponto de vista dos órgãos de controle, Senne afirma que, ao contrário da radiodifusão, em que empresas nacionais predominam, no caso das plataformas de vídeo, muitas delas são sediadas em outros países. “O desafio é fazer uma regulação específica sobre esse tipo de conteúdo”, afirma.

Pesquisa elaborada pela The Economist Intelligence Unit (EIU), com o apoio do Instituto Alana, em 2017, estimou que a proibição da publicidade infantil traria benefícios, como uma população mais saudável, física e psicologicamente, com resultados econômicos positivos, que variam entre R$ 61 bilhões e R$ 76 bilhões, logo nos primeiros 15 anos da proibição. 

Projetos de lei:

PL 493/13: proíbe a publicidade direcionada a crianças no horário diurno.

PL 2781/15: estabelece pena de detenção de seis meses a dois anos e multa para patrocínio de publicidade enganosa ou abusiva dirigida a criança.

PL 4815/09: proíbe a venda conjunta de lanches ou refeições e brinquedos ou brindes.

Jogos gratuitos escondem várias armadilhas para compras, alerta Safernet

O psicólogo e diretor de educação da Safernet Brasil, Rodrigo Nejm, revelou, sem citar números, que tem recebido mais demandas relacionadas a problemas de dados pessoais e fraudes com crianças e adolescentes que se envolvem em determinados comportamentos na rede. 

“Um jogo gratuito baixado no celular pode conter várias opções de compra. Esta é uma questão complicada: da publicidade disfarçada de jogo, que traz preocupações em relação à capacidade crítica da criança, que não tem como discernir o que é jogo, brinquedo do que é publicidade”, diz.

Nejm enfatiza que a primeira medida é que os pais tenham conhecimento dessas situações e conversem com os filhos. “Muitos se surpreendem com mais de R$ 1.000 em compras que o filho fez, dentro de um jogo, sem nem saber”, afirma. 

Além disso, o psicólogo ressalta que a primeira triagem para escolha dos aplicativos e plataformas deve ser feita pelos pais ou responsáveis pela criança. 

“É sempre bom os pais fazerem essa avaliação rápida. Na hora de baixar, que ele mesmo jogue uma partida, assista ao vídeo, conheça o estilo do vídeo ou do jogo que os filhos estão querendo usar para ter crivo”, explica.

Segundo Nejm, muitas famílias acabam aceitando o fato de o filho saber mexer em determinada tecnologia, mas não reconhecem que as crianças não têm discernimento crítico sobre o efeito danoso que ela pode provocar.

“Os pais não podem achar que essa capacidade crítica vem junto só porque a criança sabe apertar alguns botões do tablet. Existe um grau de complexidade e sutileza nesse tipo de publicidade. A escola também não pode se privar desse debate do uso crítico das redes”, diz.